Por indicação de um amigo, conheci o livro que retrata o massacre ocorrido em meados da década de 1970, que vitimou seis pessoas integrantes da Vanguarda Popular Revolucionária [VPR], emboscados numa granja no município de Abreu e Lima, na região metropolitana do Recife. O massacre da Granja São Bento é um livro-reportagem que mescla elementos de pesquisa documental com jornalismo literário, com uma narração frenética, de autoria de Luiz Felipe Campos.
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local de execução dos militantes da VPR |
Publicado pela CEPE Editora em 2017, o leitor tem acesso à história de um homem que se uniu a um importante torturador do período militar, chegando a enviar sua própria companheira para a morte, num caso que entrou para o rol de crimes mais brutais cometidos no período da Ditadura Militar no Brasil. A mídia da época, inclusive, chegou a noticiar o caso como sendo uma troca de tiros com os 'terroristas'. Só muitos anos depois é que a história veio à tona sem o corte da censura, em que se revelou não ter ocorrido um tiroteio e sim um massacre, pois os membros da VPR se encontravam desarmados na casa da granja. E as cenas do crime foram forjadas para parecer que houve um confronto armado.
Capítulo por capítulo, o leitor vai tendo conhecimento do caso desde o início, quando o grupo se formou, de como eles foram atraídos para o sítio em que foram assassinados; o autor também narra a trajetória de cada uma das vítimas, bem como o envolvimento de cada uma delas na história político-social do país naqueles anos de chumbo... Ele faz um adendo com relação as notícias que foram divulgadas na época, a fim de esclarecer a versão oficialmente apresentada no período do crime.
Utilizando-se de uma biografia respeitável, Luiz Felipe traça um panorama sobre os acontecimentos naqueles anos até a noite do crime, em janeiro de 1973. A obra é bem detalhada, desdobra o 'depois' da chacina e de como ela afetou a vida dos parentes de Jarbas Marques, José Manoel da Silva, Eudaldo Gomes da Silva, Evaldo Luiz Ferreira de Sousa, e as mulheres que compunham o grupo: uma tcheca de nome Pauline Reichstul e a paraguaia Soledad Barrett Viedma, esta última companheira do Cabo Anselmo, que foi o responsável pela captura, tortura e assassinato dos militantes.
O delegado Sérgio Fleury foi o grande responsável pela execução da chacina, aliado ao Cabo Anselmo, que agia como agente duplo até o desfecho da operação. De um lado, eles lutavam a fim de aniquilar a 'subversão' daqueles que se opunham ao movimento militar e de outro, os militantes assassinados se aliavam a grupos clandestinos revolucionários a fim de colocar um ponto final na ditadura instaurada no país desde o golpe em 1964.
O massacre da Granja São Bento é o livro de estreia do autor, formado em Jornalismo pela Universidade Federal de Pernambuco, fruto de um estudo investigativo que durou pelo menos cinco anos de apuração de fatos, documentos e entrevistas. O livro conta ainda com algumas fotografias de época, que ajudam a elucidar a narrativa...
A leitura dessa obra é essencial para se entender um pouco o contexto da Ditadura Militar no Brasil e de como certos acontecimentos em nossa atualidade são reflexos daqueles anos. Uma boa recomendação para sair do limbo da ignorância que boa parte da população se encontra hoje em dia, por causa de uma mídia manipuladora, políticos 'messiânicos' e descontentamento social que levam tais indivíduos a acreditarem em promessas extremas desprovidas de reais soluções...
Aos aficionados pela temática, aos leigos que sentem curiosidade, a estudantes, acadêmicos e afins... eis uma proposta atrativa, informativa e sem preâmbulos...