quinta-feira, fevereiro 29, 2024

Feliz ano Novo, de Rubem Fonseca

 



Feliz ano Novo é um livro de contos do escritor Rubem Fonseca, considerado por muitos como sua obra-prima, ou - pelo menos - um de seus mais polêmicos. Chegou a ser censurado nos anos de chumbo, os 21 anos em que o Brasil viveu sob um regime de Ditadura Militar. Segundo a Censura, o livro tinha conteúdo impróprio, que ia contra os bons costumes e a moral da sociedade. 

Nascido em 1925, Rubem Fonseca escreveu mais de 20 títulos, dentre eles Agosto, O caso Morel e O cobrador. Apesar da censura, que alegou apologia à violência, os contos de Feliz ano Novo desvelam ao leitor personagens marginalizados, bem construídos e que representam as variadas camadas sociais da época. 

Uma das características mais marcantes na escrita do autor é a linguagem visceral, contundente que impregna os cenários e seus personagens. Além da violência, temas como sexo e conflito entre as classes burguesa e pobre são constantes nas tramas. 

Um dos contos mais perturbadores é sobre um pai de familia, que - escondido de todos - atropela pessoas na rua por puro deleite. Agruras de um jovem escritor aborda o assassinato de uma mulher, morta pelo marido. O outro fala sobre perseguição que culmina em morte. Feliz Ano Novo, homônimo, é sobre um assalto que atinge graves proporções e termina em "pizza", ou - na verdade - em brinde de reveilon.. 





Rubem Fonseca recebeu o Prêmio Jabuti 5 vezes, tendo sido premiado também com os prêmios Camões e Juan Rulfo. A Editora Nova Fronteira possui vários títulos do autor publicados. Além de contos, escreveu novelas, crônicas e romances. 



quinta-feira, fevereiro 22, 2024

Nossos Ossos, Marcelino Freire

Heleno é natural do interior de Pernambuco mas vive em São Paulo há muitos anos. Seu namorado fazia programas e foi morto, sendo deixado no IML da cidade sem que ninguém de sua família reclamasse o corpo. Coube a Heleno o papel de transportar o defunto de volta para sua terra natal, a fim de ter um enterro decente dado por seus familiares. 

A partir dessa premissa, a trama se desenrola por meio de flashbacks, em que o leitor vai conhecendo a aventura de Heleno, ao sair de sua pequena cidade interiorana rumo à capital paulistana, bem como os percalços que passou desde se encontrar com Carlos, o amor de sua vida, até o regresso às suas origens, após deixar o corpo do jovem em Poço do boi. 




A história tem um quê de poético em meio a tragicidade de seu desenvolvimento. Personagens marginalizados ganham espaço na narrativa, mostrando que, mesmo invisíveis numa capital gigantesca, que engolfa suas existências durante o dia, são indivíduos que vivem nas noites e madrugadas da cidade cor de chumbo, carregando a trama de reflexões existenciais. 






Natural de Pernambuco, tendo vivido alguns anos na Bahia, Marcelino Freire é um dos escritores mais aclamados da literatura pernambucana contemporânea. Além de Nossos Ossos, possui outras publicações notáveis, como Angu de sangue, Contos negreiros [vencedor do Prêmio Jabuti de 2006], e alguns de seus contos foram adaptados para o Teatro. 

Nossos Ossos é uma obra publicada pela Editora Record e foi ganhadora do Prêmio Machado de Assis, sendo traduzido também para o espanhol e publicado na Argentina e em Portugal. 






quinta-feira, fevereiro 15, 2024

A poesia de Alejandra Pizarnik em Árvore de Diana

 Publicada aqui no Brasil pela Relicário Edições, Alejandra Pizarnik possui uma obra curta, devido talvez a sua breve existência, interrompida após uma dose de barbitúricos, pondo fim à sua vida aos 36 anos. Árvore da vida data de 1962, seu prólogo foi escrito por Octavio Paz, amigo da poeta. 





Através da poesia que consta Árvore da vida, é possivel ao leitor identificar o estilo de escrita de Pizarnik, que viria a se consolidar a partir dessa obra. Podemos conhecer Alejandra e seus gostos por meio de seus versos, seu interesse crescente nas artes plásticas e sua habilidade em desvelar em poucas linhas suas angustias e inquietações. 


agora

nesta hora inocente

eu e a que fui nos sentamos

no umbral do meu olhar.


ahora

en esta hora inocente

yo y la que fui nos sentamos

en el umbral de mi mirada.


 Interessante perceber um tema recorrente em seus escritos: o duplo, a figura do outro, espelhada. A personagem que se identifica com o sujeito do poema. A própria Alejandra que modificou o nome. De Flora passa a ser Alejandra, seu pseudônimo com que passa a assinar seus livros. Seu discurso parafraseia Rimbaud para compreender as tragédias de sua vida. 

Seus versos carregam uma visceralidade pungente, que representam bem sua vida na Argentina, numa época dada a eclosão de golpes de Estado no país. 


tenho nascido tanto

e duplamente sofrido

na memória daqui e de lá.


he nacido tanto

y doblemente sufrido

en la memoria de aquí y de allá.




quinta-feira, fevereiro 08, 2024

A briga dos dois Ivans - Nikolai Gogol

 Ivan Ivanovitch e Ivan Nikiforovitch são dois amigos de longa data e sua amizade é admirada pela população do vilarejo onde vivem, no interior da Ucrânia. A história se passa nas primeiras décadas do século XIX. Apesar das diferenças entre os dois, eles mantêm uma relação cordial, respeitosa, até que em um belo dia as coisas mudam de maneira drástica.

Um chama o outro de raposa velha, devido a uma discussão boba que tem como motivo uma recusa em trocar uma arma por uma porca e dois sacos de areia. A troca de xingamentos toma proporções jamais imaginadas pela vila onde moram e pelos próprios envolvidos, que nas semanas seguintes passam a depreciar um ao outro, abalando as estruturas e convívio social até então intocáveis.

Escrita por Nikolai Gógol em 1835, essa novela intitulada A briga dos dois Ivans carrega em sua narrativa ares de comédia pastelão, revelando ao leitor a veia cômica de Gogol, tão bem empregada em sua obra. Ele usa de cinismo e desvela a natureza hipócrita da sociedade, ilustrando bem a condição burocrática de seu tempo.

Nikolai Gógol nasceu em 1809, em um vilarejo no centro da Ucrânia [antes pertencente ao Império Russo]. Seus livros possuem características do Realismo, e abordam temáticas sociais a respeito da condição humana, moralista e prisioneira de convenções. Dentre suas obras mais famosas, destacam-se Almas mortas, O capote e Taras Bulba.




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quinta-feira, fevereiro 01, 2024

De Profundis - Georg Trakl

De profundis é uma publicação da Editora Iluminuras e reúne a maior parte da breve obra de Georg Trakls, poeta austríaco, nascido em Salzburgo, ainda parte do Império dos Habsburgos em 1887. Aos 27 anos, ceifa a própria vida após ingerir uma dose de cocaína, aproveitando seus conhecimentos em farmácia para pôr um fim aos seus dias.



É considerado um dos grandes nomes da poesia expressionista do século XIX, e graças ao trabalho de tradução de Cláudia Cavalcanti, o leitor brasileiro tem em mãos essa obra singular, que retrata tão bem a angústia de seu criador, ao relatar em versos suas experiências melancólicas e memórias dos meses que passou em guerra, presenciando morte ao seu redor.

 

O azul de meus olhos apagou-se nesta noite,

O ouro vermelho de meu coração. Ah, tão quieta ardia a luz!

Teu manto azul envolveu o desfalecente;

Tua boca vermelha confirmou a loucura do amigo.

 

Die Bläue meiner Augen ist erloschen in dieser Nacht,

Das rote Gold meines Herzens. O! wie stille brannte das Licht.

Dein blauer Mantel umfing den Sinkenden;

Dein roter besiegelte des Freundes Umnachtung.

 

É interessante encontrar na poesia de Trakl uma espécie de sinestesia, em que o poeta utilizava descrição de cores para simbolizar sentimentos e passagens descritas em seus poemas. A melancolia era um dos aspectos mais representados ao longo de sua obra, bem como a decomposição do ser e suas implicações. Trata-se de uma poesia dolorosa, pungente, que parece desprovida de esperança, agonizante.

Um de seus poemas fala sobre a batalha de Grodek, em que quase cem feridos graves agonizaram, sem que ele nada ou pouco pudesse fazer. Em meio a desertores sendo mortos a tiros, um dos feridos se mata com um tiro em sua presença. Os traumas adquiridos com tais experiencias parecem dar mais força para sua própria tentativa de suicídio, mal sucedida após o episódio, mas realizada posteriormente, quando finalmente consegue seu intento.

Em 03 de novembro de 1914, Georg sucumbe à uma super dose de cocaína. Era o fim [físico] aos prematuros 27 anos, mas os seus versos se configuram imortalizados na poesia clássica do século XIX/XX.

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