F, de Antônio Xerxenesky

E a melhor leitura do mês não poderia ter sido melhor. F. Sim, o nome do livro é apenas isso: F. Escrito por Antônio Xerxenesky e publicado pela Editora Rocco, esse livro de apenas 240 páginas fala sobre a história de Ana, uma brasileira que mora nos Estados Unidos e que é matadora de aluguel. Numa simples ligação anônima, ela vai lá, faz o serviço e ganha uma grana, e vai se sustentando com isso. Ela tem apenas 25 anos, mas já viu sangue e violência com uma naturalidade de quem faz arte com a morte... 

Ambientada nos anos 80, a história faz referências a alguns fatos históricos ocorridos no Brasil, como a infância da protagonista no período da Ditadura Militar, quando seu pai [adepto das idéias dos 'milicos'] morre, e conhece um tio no velório dele, que de início se mostra suspeito, mas por quem ela nutre amizade tempos depois, por meio de cartas escondidas da mãe, e graças a ele, vai morar em Los Angeles, sem que sua mãe desconfie para onde ela está indo, já que não gosta de seu cunhado. Posteriormente descobrimos que a relação entre os irmãos não era boa, em virtude de seu tio José ser admirador dos 'camaradas' perseguidos no período da ditadura, ao contrário de seu pai, senhor da moral e bons costumes, mas que por trás das cortinas de conservadorismo, não passava de um crápula asqueroso e doentio [não darei detalhes do porquê pois seria um baita spoiler]. Com o tio, Ana aprende a atirar, vai pra Cuba e passa um tempo por lá treinando táticas de guerrilha e sobrevivência. Muito do que faz em sua vida atual, deve a essa época... 

Ana tem uma irmã, a quem ela chama de Lúcia, e descreve a trajetória suicida dela, de quando ela cortou os pulsos, de quando tentou pílulas e em paralelo à história de seu novo 'trabalho encomendado', faz incríveis alusões à Ian Curtis, do Joy Division com o problema da irmã... E falando em trabalho, a tarefa que lhe designaram por meio de telefonemas anônimos seria de matar Orson Welles, famoso cineasta da época. O grande produtor do filme Cidadão Kane. Ana, disfarçada de tradutora e amante do cinema, viaja para Paris a fim de cumprir seu objetivo, se vê envolvida com o mundo da 7ª arte, e quando consegue se aproximar de Welles, a convivência com ele torna a tarefa mais difícil... Então, ela passa a questionar sua missão, e a medida que o prazo estipulado por seu empregador misterioso chega ao fim, ela se vê desesperada querendo voltar atrás, e se vê perdida, sem saber como se livrar desta empreitada...

Peguei esse livro emprestado por indicação de meu amigo e professor Alberon [ele sempre com as melhores dicas*risos*] e confesso que estou tentada a 'dar o ganho no livro dele' mentira, tô brincando *risos*. Mas sim, o livro é excelente, e foi meu primeiro contato com o autor, do qual já me rendi apaixonada. A escrita de Xerxenesky [eu amei esse sobrenome, sério] é fluída, leve e entremeada de devaneios da protagonista Ana, onde na terceira parte do livro ela não sabe mais o que é real e o que não é. Na primeira parte do livro, a história é sobre a vida dela e da família, de como ela virou assassina de aluguel e de quando ela recebe a proposta para matar Orson Welles. Na segunda parte, presenciamos a relação da vítima com seu algoz, onde Ana passa a questionar a arte do cinema, sua interação com dois jovens que ela conhece na capital parisiense, sem contar que ela acaba se envolvendo afetivamente' com um deles, Antoine. Nessa parte, ela passa a se envolver com o conceito do que seria Arte, visita museus, estuda sobre o assunto, pois precisa agir como uma apreciadora da arte, em especial pelo cinema de Welles. 

A terceira e última parte é sobre o desfecho. Será que ela mata o cineasta? Desiste? Que fantasmas assombram sua mente, fazendo-a transtornada? E sua irmã, consegue finalmente se matar? O título do livro faz referência a F for Fake, um filme de Orson Welles. F, de falso, pois ao conhecer o mundo mostrado pelo cineasta, Ana passa a questionar se a existência não seria apenas um acidente 'de percurso', onde tudo é permeado de simulacros suspensos no ar, sem consistência alguma... O autor escreve pela perspectiva de Ana; na realidade, é ela que nos escreve, como uma espécie de diário, que precisa desaparecer assim que finalizado, matando a Ana que nos conta sua história, para que outra mulher ressurja dela... 

Para quem curte uma leitura cheia de metáforas, referência à cultura pop dos anos 80, intrigas, cinema e em especial, o cinema de Orson Welles, é uma boa leitura. Aos que não conhecem e mesmo assim, quiserem se aventurar nessas [entre]linhas, o deleite será o mesmo... "É bonito. Mas é arte?" Pra mim, [F]oi... 






6 comentários:

  1. Olá!, Valéria! Depois de ontem, quando quase fui à falência comprando livros, por sua culpa, comprei mais um livro! ;)

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  2. Nossa, Val esse despertou-me o interesse.
    Adorei a premissa e o estilo e vindo de você a indicação já sei que deve ser uma delicia.
    Anotadissimo o nome aqui.
    Beijos

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  3. Caraca, parece ser um livro incrível mesmo.. sua resenha ficou ótima também, super me interessei!
    Parabéns :)

    Mutações Faíscantes da Porto

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  4. A Rocco, por vezes, traz títulos bem interessantes. Matadora de aluguel? amei, visto que não é comum ver mulheres ocupando o posto, principalmente por conta da época, década de 80, do século passado.
    'Será que ela mata o cineasta?', você é ma´. fiquei mega curiosa!

    http://poesianaalmaliteraria.blogspot.com.br/

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  5. A Rocco, por vezes, traz títulos bem interessantes. Matadora de aluguel? amei, visto que não é comum ver mulheres ocupando o posto, principalmente por conta da época, década de 80, do século passado.
    'Será que ela mata o cineasta?', você é ma´. fiquei mega curiosa!

    http://poesianaalmaliteraria.blogspot.com.br/

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