A cor púrpura - de Alice Walker

 2016 está sendo um ano de leituras interessantes, mas estou me permitindo revisitar livros que há muito tinha lido e que senti necessidade de trazer minhas impressões para o blog... A cor púrpura foi a última dessas obras... 

Escrito por Alice Walker, e recentemente publicado numa linda edição pela Editora Record, esse ganhador do Prêmio Pulitzer de 1983 foi escrito um ano antes e traz em suas páginas a história da personagem Celie, que desde muito cedo aprendeu que o mundo pode ser bem hostil quando se nasce mulher, pobre e negra numa região ao sul dos Estados Unidos, num período de segregação racial... 

Desde nova, Celie sofreu abusos por parte de seu pai e acabou tendo filhos desses abusos. Sua mãe acaba morrendo de desgosto por ver sua filha sendo mãe tão nova, mas logo seus filhos são apartados da jovem, e seus paradeiros são desconhecidos... Logo ela se vê forçada a casar com um viúvo, que já tem filhos e mais velho que ela, sendo separada da companhia de sua irmã Nettie. Sua vida se torna um pesadelo regado a surras e maus-tratos, mas Shug Avery aparece para minimizar a dor diária que Celie é submetida... Com a chegada dessa misteriosa mulher, as coisas parecem melhorar um pouco. Ainda assim, ela é constantemente torturada pelo destino, e passa a ditar cartas para Deus, numa tentativa de amenizar seus sofrimentos... 



A autora coloca em pauta temáticas de abuso sexual, patriarcalismo, Relação de poder, gravidez precoce, pedofilia, violência doméstica, machismo, enfim... assuntos que se interligam e todos tem como ponte a submissão da mulher perante o homem na sociedade. Distinção de classes sociais, de cor e homossexualidade [embora este último de maneira poética e sutil], também tem seu espaço nessa história comovente... 

Em várias passagens é evidente o discurso de poder do homem quando a mulher resolve se fazer ouvir, pois sua função é de cuidar de filhos e ser dona de casa, não sendo permitida questionar, sendo punida quando desobedece as ordens de seus maridos. E achei notória a maneira como as personagens em dado momento passam a querer mudar a situação...

Há um momento em que a fé de Celie já não é mais suficiente para se fazer ouvir por Deus, e suas cartas são direcionadas a sua irmã Nettie, que após ter fugido de casa, passa a viver com um casal de missionários na África, junto com os filhos de sua irmã, que ela julga mortos. E Nettie escreve várias cartas a Celie ao longo dos anos, mas o marido da irmã sempre as esconde e Celie não sabe delas por um bom tempo, até que Shug e ela descobrem as correspondências num baú trancado de 'Sinhô' e ela descobre como anda sua irmã... 

Em paralelo há outros personagens [secundários] ricamente trabalhados na trama, que não deixa margem para que caiam em esquecimento. Eles se mesclam ao fio principal da história, compondo uma colcha de retalhos bem distribuida, e que não deixa o leitor perdido em 'quem é quem' na obra... Todos se encaixam perfeitamente, com suas dores, dificuldades e amores... 

A narrativa tem uma escrita peculiar, se alternando entre as irmãs e alguns outros personagens, em forma de cartas e com a ortografia 'caipira' de alguém que não é alfabetizado, no caso de Celie e Shug. Quando são as cartas de Nettie, a escrita é de alguém que frequentou a escola... Outro fator importante é sobre o questionamento da fé, a imagem do Deus cristão [com sua imagem semelhante ao europeu], uma leve crítica ao pensamento catequista nas comunidades africanas na época do imperialismo [a história se passa no entre guerras] e quanto a segregação sulista, em que uma senhora branca não pode sentar-se no banco de um carro ao lado de uma negra, por exemplo...

"Os meninos agora aceitam Olivia e Tashi na classe e outras mães estão mandando suas filhas para a escola. Os homens não gostam disso: quem vai querer uma esposa que sabe tudo que o marido sabe? Eles se enfurecem." 

É impossível não se emocionar em alguns trechos, de se indignar em outros e principalmente identificar situações que até hoje acontecem, como se ainda estivéssemos vivendo com o pensamento aquém da atualidade, ainda regados de preconceitos, tanto com os negros quanto com as mulheres. É uma leitura forte, que por certo vai ecoar no pensamento de quem a ler, por vários dias, indo e retornando em momentos propícios à lembrança de suas páginas... 

"Os anos vieram e se foram sem uma palavra sua. Só o céu acima das nossas cabeças é o que temos em comum. Eu olho muitas vezes para ele como se, de alguma maneira, refletida na sua imensidão, um dia eu me encontrarei olhando nos seus olhos. Os seus queridos, grandes, límpidos e lindos olhos."

14 comentários:

  1. Me lembrou a história de Preciosa, da escritora Sapphire, que possui uma adaptação para o cinema, vale muito a pena assistir! Uma tragédia tão presente na vida de muitas jovens, que não tem na família o amor e respeito, tornando-se vítimas de um mundo cruel e muitas vezes hipócritas!
    Meus parabéns pela resenha Val :)

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  2. Olá!
    Não conhecia esse livro, a obra não me chamou muito atenção, apesr de eu ter gostado muito de sua resenha.
    Beijos.

    meumundosecreto

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  3. Essa capa é PERFEITA. Ainda hoje vemos o preconceito com os negros nesse pais. É realmente triste isso! Imagine nessa época como o negro pobre sofria. É um livro que eu gostaria de ler sim, tem uma história maravilhosa e que precisa ser espalhada para todas as pessoas para elas lerem.


    Oxente, Leitora!

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  4. Esse livro é maravilhoso. É realmente impossível não se emocionar com a história. A mensagem é realmente forte, o que causa dias de análise para as atitudes que infelizmente não são distantes da nossa realidade. Enfim, é um livro que deveria ser lido por todos.
    Bjim!
    Tammy

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  5. Oiii Maria, tudo bem?
    Que livro maravilhoso garota <3 creio que me emocionaria muito com a obra, choraria em certos momentos, diante disso com toda certeza eu leria <3 é um livro emocionante e que se tornaria um dos meus favoritos futuramente.
    Beijinhos

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  6. Esse livro tá na minha wishlist mas não estou podendo no momento $$
    Sua resenha está ótima, uma boa visão sobre o que a obra aborda, só me instiga mais ainda a adquiri-lo. Adorei, parabéns!
    Abraço;

    http://estantelivrainos.blogspot.com.br

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  7. Olá!
    Eu ainda não tive oportunidade de ler essa obra, somente assisti ao filme (que posso dizer: é incrível).
    Eu gosto do fato do livro ser um romance epistolar, já li alguns livros assim que me agradaram bastante. Acho as temáticas da obra bem fortes e com uma carga dramática intensa, que atinge o leitor em cheio. Eu, sem dúvidas, quero conferir o livro!
    Ótima resenha!
    Beijos!

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  8. Eu ainda não tinha visto resenha sobre esse livro, mas alguns amigos meus já me falaram sobre ele, alguns de ponto positivo e outros negativos, não me vejo lendo ele por hora, mas pode vim a se tornar uma leitura futura, quem sabe né? Ótima resenha.

    Beijos

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  9. Oie
    nossa, essa história é extremamente triste, li recentemente e com certeza me deixou reflexiva por tempos e a leitura é extremamente interessante, muito linda sua resenha

    Beijos
    http://realityofbooks.blogspot.com.br/

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  10. Maria!
    Li sua resenha e já corri no Skoob pra marcar nos desejados.
    Eu amo esse tipo de história! Sempre sofro e me comovo, morro de chorar, mas mesmo assim eu amo.
    Já quero ler desesperadamente!

    Beijo grande!

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  11. Oi! Tudo bem?

    Nunca tinha ouvido falar no livro, mas já sei que quero ler. Gosto muito de realizar leituras que coloquem em pauta determinados temas como, por exemplo, o abuso sexual, a segregação racial... É triste perceber que uma obra escrita há tanto tempo ainda reflete aspectos da nossa sociedade atual. Enfim, creio que seja uma leitura muito profunda e intensa.

    Beijos,

    Juliana Garcez | Livros e Flores

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  12. Oi, Val. Tudo bem?
    Eu já v esse livro por aí e fiquei com vontade de lê-lo, mas sabe quando a gente sabe que vai sofrer se ler a obra? Então... Eu não sou uma pessoa sensível pra grande parte das coisas, mas pra esses assuntos que o livro aborda sim, então penso várias vezes antes de ler algo com essa temática, porque me indigno com as coisas, ainda mais sabendo que isso acontece na vida real e que não posso fazer nada pra mudar. Enfim.
    Beijos <3

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  13. Chorei de soluçar, igual criança mesmo,e ao mesmo tempo uma revolta, indignação e saber que na verdade as coisas não mudaram.
    Assisti o filme também.
    Bjs

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  14. nunca li esse livro, sempre via comentários, uma ou outra resenha mas nunca li, e só de ler tua resenha já sei que é o tipo de livro que faz a gente chorar.

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